quarta-feira, 23 de julho de 2008

O dia em que minha alma chorou


A PRIMEIRA MISSA
(Netinho)

Hoje fui ao MARGS ver a obra A Primeira Missa.
Não vou falar sobre sua beleza, suas cores ou sua luminosidade indescritível. Vou falar sobre a emoção que senti quando me dei conta que há muito tempo eu não alimentava meu espírito. Isso mesmo, meu espírito precisa ser alimentado e o que ele mais gosta é de “Artes Plásticas”. Talvez porque saiba que é mais fácil esse corpo débil levá-lo ao museu do que fazer qualquer outra coisa que demande algum esforço físico. Será que minha alma não gostaria de pintar, cantar, tocar, dançar ou representar? Sinto uma vontade imensa de fazer tudo isso. Deve ser as suas manifestações, as suas súplicas.
Quando vi a obra, quando vi as pessoas que junto comigo também a admiravam, me emocionei. A emoção foi tanta que chorei. A fome do meu espírito era tanta que devo ter absorvido todas imagens em poucos segundos. Também fiquei admirado com as pessoas que encontrei no museu. Havia velhos, jovens e muitas crianças. E não era programa de escola, não. Eram crianças acompanhadas de suas mães. As mães estavam levando os filhos no museu. Só tinha visto isso na Europa e senti uma alegria muito grande. Lembrei quando vi pela primeira vez uma obra de Da Vinci. Lá eu também chorei, mas chorar em museu europeu é chique, nao conta. Chorei na Capela sistina e chorei diante de muitas outras obras e monumentos. Hoje lembrei de Veneza, Florença, Madri e de Lisboa (essa cidade que não saí do meu coração, parte de mim está lá). Todas as cidades recheadas de museus. Todos os museus recheados de almas famintas, insaciáveis.
Mas voltando para a minha emoção de hoje, fiquei pensando nas suas razões. Porque eu chorei? Penso que foi pela fome, pois era tamanha a fome que eu sentia que já nem a percebia mais. Eu já não percebia minha alma!
Passo meus dias inteiros me dedicando ao meu trabalho. No fim de semana, busco o alento de meus amigos, poucos e especiais, em momentos de festiva reclusão (paradoxo?).
Mas por onde eu andei todo esse tempo? Por lugar nenhum. Como dói perceber que andei por lugar nenhum, como dói perceber que durante anos andei no escuro, tal como se cego eu fosse. Toda a arte está ao meu redor e eu não consigo enxergá-la. O que eu estava fazendo que esqueci completamente da minha essência? Nada. E como dói perceber que durante muito tempo estive sem fazer coisa alguma que saciasse a melhor parte de mim, a minha alma.
Por acaso ou não, essa semana pensei em aprender piano, um antigo sonho, delírios de uma criança. Daquela mesma criança que abandonou o sapo moribundo e decidiu cursar a faculdade de Direito. Uma vez, ainda adolescente, conversei com um pianista amigo de meus pais e falei desse sonho. Não do sonho de ser um pianista, mas apenas de saber tocar. Ele me disse que eu devia tentar, mas argumentei que estudar piano demanda anos de dedicação. Lembro até hoje da resposta que ele me deu: “Quando começares a estudar, o tempo vai passar e a cada dia vai faltar menos tempo.”
Hoje, nesse momento, me pergunto por que não realizei meu sonho. Assim como o teatro, outro sonho que deixei de lado também na minha adolescência.
E o que são nossos sonhos se não os desejos de nossa alma? Assim como sinto vontade de comer um doce especial, minha alma também tem seus desejos. E os desejos da alma devem ser atendidos antes dos desejos do corpo. Abandonei minha alma. E entristeço ao ver que durante todos esses anos em que estive na completa escuridão minha alma padeceu. Definitivamente preciso alimentá-la, realizando seus sonhos. Nem que seja em agradecimento por ela ainda não ter me deixado. E então, calmamente, decido que a Primeira Missa da minha alma será o teatro. O piano fica para depois. Vou começar a fazer teatro, esse é o seu pedido mais antigo. Hoje minha alma chorou pela última vez.

Um comentário:

Andy disse...

Querido Netinho
Adorei o texto, adorei teu momento contigo e com todos!
Adorei principalmente tua transparência!

É isso mesmo...escrever com a alma é fazer arte! O importante do post é a lição de respeito a nós e que as vezes esquecemos de nos cuidar!

O teu momento foi único!

Adorei